É melhor morrer em casa ou no hospital?

Camila Appel

Morrer em casa é mais pacífico e gera menos sofrimento tanto para o paciente quanto para os que o amam, mas demanda um suporte mais amplo. A conclusão é de um estudo divulgado nesta quinta-feira (8) pelo jornal médico da BioMed Central (BMC).

Há fatores determinantes para esse cenário: ter suporte familiar, acesso a cuidados paliativos domiciliar e à enfermagem comunitária. O estudo indica que devem ser criadas políticas públicas que garantam essas condições e assim, melhorar a qualidade de morte das pessoas.

Outros elementos aumentariam a chance de uma morte em casa, como a consciência familiar de uma doença sem cura, a discussão das preferências do paciente e a quantidade de dias de licença do trabalho que os parentes tiveram nos últimos três meses de vida do familiar.

Um exemplo é a situação existente em países como Canadá, Holanda, Noruega e Suécia, que desenvolveram programas sociais semelhantes à licença-maternidade para oferecer suporte às famílias que querem cuidar de seus parentes no final da vida.

O estudo, realizado em Londres, indica cuidado ao ser reproduzido para outras regiões com menos acesso às condições mencionadas acima, como é o nosso caso.

Mas é interessante observar que seu resultado trouxe uma preferência da população pela morte domiciliar, tendência já verificada em países como Estados Unidos e Canadá. Ao passo que no Japão, na Alemanha, em Portugal e na Grécia, a “morte institucionalizada” (como se refere o estudo, e quer dizer morte no hospital) é mais escolhida.

A autora principal do estudo, Barbara Gomes, diz que muitos pacientes temem morrer em casa para não serem um fardo para sua família, mas seu estudo encontrou evidências de que o sofrimento de morrer em casa é menor para a família também.

E no Brasil?

Reportagem desse ano da Folha indica o aumento de atendimento domiciliar na área da saúde (de uma forma geral), tanto na rede privada quanto na pública. Em relação à pública, o artigo constata: “Em 2012, o país tinha 184 equipes cadastradas para atender pacientes por meio do programa Melhor em Casa. Hoje, são 794. Apesar do aumento, a iniciativa não atingiu a meta, que era chegar a mil equipes até 2014. O Ministério da Saúde diz que habilitou outras 761 equipes, que dependem da iniciativa das prefeituras e Estados”.

Vou retomar algumas das entrevistas feitas no blog, pincelando comentários sobre a questão específica desse post.

A médica especializada em cuidados paliativos Milena Reis considera que morrer em casa, ao lado de quem se ama, seria o ideal. Mas ela destaca que isso pode ser complicado, porque algumas famílias não têm estrutura emocional para cuidar de um doente terminal, ou mesmo física. Ela dá o exemplo de um caso em que a cadeira de rodas do paciente não passava pela porta de entrada do apartamento. O alto custo de um “home care” também seria um fator limitante. Milena faz um paralelo entre parto humanizado e a morte em casa. Na medida em que começamos a discutir um, poderíamos passar a discutir o outro. Por que não colocar em pauta as condições necessárias para uma morte domiciliar? Quais políticas públicas precisariam ser desenvolvidas?

O geriatra Paulo Camiz considera que o maior medo dos mais velhos é sentir dor e solidão. Ele comenta que alguns usam frases como “ter medo de ser abandonado” e de “dar trabalho”. Paulo diz: “Quando uma pessoa está morrendo, tudo o que ela não quer é ficar sozinha e tudo o que os familiares mais fazem é deixá-las sozinhas. Vejo muito isso. Nos principais hospitais, boa parte dos pacientes que estão na UTI não precisariam estar lá. Mas é mais cômodo para o médico, porque tem um plantonista 24h a disposição para cuidar daquele paciente. A UTI facilita essa solidão, ela é muito desconfortável para visitas”.

Maria Goretti Salles Maciel, médica presidente da Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP), diz que “não dá para ser muito romântico. A morte em casa pode ser uma morte boa, desde que você tenha acesso a uma assistência domiciliar, o que nem sempre é verdadeiro. Essa assistência seria um bom apoio da família e de bons profissionais. Meu pai morreu em casa. Mas eu estava lá e assumi os cuidados dele. Eu não sei se eu gostaria de morrer em casa não… Talvez para meus filhos seria mais prático eu morrer num hospital”.

Para a jornalista Eliane Brum, o importante é não se trocar um tabu pelo outro, um imperativo pelo outro – e defender que morrer em casa é melhor do que no hospital, por exemplo. “Passamos boa parte do século 20 silenciando sobre a morte, e agora, quando ela começa a ser falada, seria muito triste que se criassem outros dogmas para isso. Eu não acho que tem um jeito certo ou errado de morrer. Tem o jeito de cada um. Algumas pessoas acham melhor morrer em casa, cercadas pelas pessoas que amam, pelos objetos que fazem parte do seu mundo, contando histórias e ouvindo histórias. Outros vão achar melhor morrer no hospital. Tem quem vai tentar tratamentos invasivos, mesmo sabendo que há pouca ou nenhuma chance de ter resultado, outros vão preferir não. O importante é que os desejos sejam respeitados, que esse último ato da vida de alguém seja vivido nos termos dessa pessoa. Que a pessoa possa escolher e não que escolham por ela”.

O artigo será disponibilizado nesse link com acesso gratuito:

http://www.biomedcentral.com/1741-7015/13/235

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