A Quarta Parede
“A Quarta Parede” é um longa metragem de trabalho de conclusão de curso da Escola de Atores Wolf Maia, dirigido por Hudson Senna e escrito por Bruno Autran. Está em cartaz por duas semanas em diversas cidades do país pelo Projeta às 7, uma iniciativa do Cinemark e da elo Company para fomentar o cinema nacional. Com a proposta de expor dilemas desses jovens atores, o filme começa com um velório. O caixão em primeiro plano. Um dos atores de uma companhia teatral se matou.
O enredo é o processo de montagem da peça “Entre Quatro Paredes” de Sartre. O protagonista, Tutty Mendes, se destaca na atuação interpretando as artimanhas de um ator que faz de tudo para conseguir um papel.
Ele foi escalado para ser assistente de direção na montagem dessa peça e não engoliu o escanteio muito bem. Entre suas ciladas, leva uma menina a ser estuprada e um menino a se matar. Ele se defende para uma delegada. Diz que não há culpa em induzir um estupro ou um suicídio. Cada um é responsável por suas próprias atitudes. Me lembrou um pouco o “13 Reasons Why”. A menina, ao se matar, faz uma lista de culpados pela tragédia. Essa discussão foi levantada durante a exibição da série. Quem pode ser culpado por um suicídio? A resposta merece um aprofundamento não oferecido na proposta desse filme.
Seu objetivo maior me parece ser estético. Apresentar esses jovens atores, apaixonados pela profissão, que mergulham agora em uma selva competitiva e em crise política. Não apenas os cortes de verbas prejudicam a cultura, mas também o corte moral. Esse filme, por exemplo, está com cara de ser candidato a uma proibição “amanhã”. Não poupa em nudez e em cenas de sexo. “Esses jovens são hiper-sexualizados”, me falou o diretor. Eu arrisco achar que a nudez é um pouco exagerada, mas são tão bem filmadas, que se justificam e realçam o objetivo estético do filme. Parece um grito contra esse moralismo que vem ressurgindo.
A companhia teatral representada é bem estereotipada. Ela lembra uma companhia dos anos 70… O diretor arrogante que se acha o centro do universo e faz seus pupilos chorarem. Aqui, mais uma vez, a estética se sobressai. As cenas da montagem da peça são visualmente lindas. Há poesia e entrega dos atores. Para escalar os personagens, o diretor fictício pergunta quantos seguidores cada um tem no Instagram. Achei que era uma piada. Ao conversar com os atores e com a equipe do filme, me surpreendi ao descobrir que é real. Muitos testes levam isso em consideração. Agências chegam a falar para seus atores comprarem seguidores.
Saí do cinema com a impressão de que os jovens atores de hoje querem ter voz ativa, não se deixam reprimir, digerem suas angústias na bebida e nas drogas (assim como os adultos), são hiper sexualizados, sacaneiam uns aos outros um tantinho (ou um tantão, no caso do protagonista), e alternam entre amor e ódio intenso o tempo inteiro. Encontram no grupo sua âncora e seu espelho, o que remete à peça de Sartre, “o inferno são os outros”. Nada diferente dos jovens de ontem e dos de amanhã.
A grande diferença está nas taxas de suicídio, que têm crescido. Uma realidade triste que merece ser discutida com profundidade. Tanto no jornalismo quanto na ficção.
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