O que tá salvando é a gorjeta dos clientes, diz motoboy delivery

Roberto (nome fictício) é motoboy de delivery desde 2004. Ele tem cadastro em todos os aplicativos de delivery disponíveis. Dos mais conhecidos, menciona o Uber, Rappi, Loggy e Ifood. “Com um aplicativo só, é impossível ter renda. Ainda mais agora que os pedidos diminuíram muito e a quantidade de motoboys triplicou”.

A maioria dos pedidos ocorriam na hora do almoço das empresas que hoje estão fechadas. “E com o aumento de desemprego, todo mundo virou motoboy da noite pro dia. Como entrou gente nova, acabaram diminuindo o valor das taxas, porque sabem que quem tá entrando vai topar. Os mais antigos acabam sofrendo mais”.

Fazia três pedidos por hora, agora não chega a um por hora. Ganha porcentagem ou fixo, dependendo do aplicativo. Também pagam por quilometragem. “To com uma corrida agora que é de 4 km para ganhar R$5. O que ta salvando é a gorjeta dos clientes”.

De todos os aplicativos disponíveis, tem pego mais pedidos da Rappi, pela diversidade. “O que ta tocando melhor é a Rappi, porque tem pedido de mercado, farmácia, tem o ‘qualquer coisa’. Não é só comida, entrega de tudo”.

Ele não pode escolher pedidos, com exceção da Loggi. “Se você recusar pedidos, o aplicativo te bloqueia. A que mais faz mais é o Ifood. Eles te bloqueiam por meia hora se você recusar o pedido. Se você aceitar o pedido e não retirar, você ficar bloqueado em torno de uma hora. A Rappi só bloqueia se for cinco seguidos”.

Sua remuneração varia de R$ 70 a R$ 150 por dia. Ontem, ele diz ter sido atípico. Chegou em casa com R$ 230.

Dirige das oito da manhã às dez da noite para tentar sustentar a esposa e os seis filhos. Quando chega em casa, na periferia da zona sul de São Paulo, não vai direto para o abraço. Tira toda a roupa na porta e lava. “Se eu me contaminar, vou ta contaminando mais cinco comigo”.

O dia todo na rua recebendo e entregando gera medo de pegar a doença. “A gente não sabe quem ta preparando o pedido, não sabe se o porteiro do prédio ta com o vírus,  você não sabe quem colocou a mão no portão. E, às vezes, a gente é obrigado a entrar no prédio. Tem passar álcool gel na mão o tempo todo”.

Ele contou que o Ifood distribuiu álcool em gel, gratuitamente, a todos motoqueiros. O Uber não distribuiu, mas reembolsa a compra. Nenhuma empresa ofereceu máscara. Todos pedem para deixar a entrega na porta e manter a distância de dois metros.

Sua maior preocupação é a ‘sala de espera’. “Ir a um restaurante que tem alta demanda, como o Pátio do Shopping Morumbi e o Morumbi Tower. Fica todo mundo esperando junto. Alguns usam máscara, outros não”.

Ele diz que na região onde mora, periferia da zona sul de São Paulo, o pessoal não está se cuidando. “É muito fluxo de gente. Você vai na lotérica, a fila ta demorando em torno de duas horas. É um ao lado do outro, poucas pessoas tão com mascara. Se eu tiver que ir na lotérica, vou para o Itaim, Vila Olímpia, ta mais vazio”.

Além da contaminação, ele teme o aumento dos golpes. “Tem gente que faz a compra, se arrepende e cancela o pedido. Isso gera uma dívida para o motoqueiro. Você pediu um mercado, aí você não quer mais. Como a base da Rappi ta fechada, por causa do coronavírus, não tem para onde você levar os produtos. Teve um motoboy que ficou com 600 de dívida por causa de uma compra de mercado. Você sai para trabalhar e fica no prejuízo”.

Roberto teve outro tipo de problema: foi bloqueado pela Uber por não ter entregue um pedido. Não o consultaram sobre o ocorrido, apenas o bloquearam. Ele conseguiu verificar o que ocorreu – entregou o pedido mas o cliente ligou dizendo que não tinha sido entregue, ficou com o produto e ainda foi ressarcido do valor.

Nesse sentido, a Rappi estaria mais precavida, solicitando um código do usuário para identificar se a compra foi entregue.

Por fim, Roberto pede por mais valorização e respeito pela profissão.

É importante se conscientizar antes de cancelar um pedido, dar gorjeta se possível, não aplicar golpes como dizer que a compra não chegou, e se higienizar antes de entrar em contato com um motoqueiro de delivery. Afinal, ele também tem uma casa e uma família para cuidar.