Hoje os chamados estão mais coerentes – diz motorista de ambulância do SAMU

Abel Toledo é motorista de ambulância do SAMU há 9 anos. No turno das sete da noite às sete da manhã, ele atende chamados de resgate. São acidentes de trânsito (principalmente com motos), parada cardíaca, trabalho de parto, pessoas em situação de rua, embriaguez e por aí vai. Todos os motivos que fazem uma ambulância ser acionada.

No começo do ano, ficou afastado do trabalho. Ele sofreu um infarto e precisou de um mês para se recuperar.

Quando voltou à rotina, o novo coronavírus tinha dominado as manchetes. Aos poucos, foi vendo seu dia a dia mudar.  “Hoje, os chamados estão mais coerentes.  A população se conscientizou, e, de fato melhorou a triagem”, diz.

Chegava a receber 8, 9, chamados por dia e agora são 3, 4, por plantão. Alguns dos chamados “sem importância”, como define, são unha encravada, cólica menstrual e bebedeira. “Já aconteceu de passar na triagem como parada cardiorrespiratória e você chega lá e é uma pessoa embriagada”.

Toledo tem medo de ser contagiado pelo vírus. Além de ter sofrido um infarte recentemente, ele tem diabetes. Faz parte do grupo de risco.

Para se proteger, usa todos os equipamentos de proteção indicados, como luvas, máscara, avental, touca, e óculos. Na primeira vez em que nos falamos, há duas semanas, não usava a proteção completa em todos os atendimentos. Hoje, com o avanço da contaminação, já sai preparado independente do motivo.

Ao chegar em casa, tira toda a roupa e deixa do lado de fora. Seu maior medo é contaminar sua família. “Minhas filhas e meu neto são os bens mais preciosos que eu tenho”.

Toledo relata preocupação com a conscientização da seriedade da pandemia. Uma colega, antes cética, mudou de opinião após ver dois colegas de profissão serem infectados.

“A sociedade ainda precisa tomar a ciência do perigo que é a Covid-19. Por mais que tenha aumentado as mortes, o pessoal ainda não caiu a ficha”, lamenta.

Não se vê como um dos heróis exaltados no momento e gostaria que seu trabalho fosse mais valorizado. Ele contou sobre um episódio passado, em que pegou um caso suspeito de outro vírus contagioso.

“Tínhamos que tomar o coquetel de remédios, como prevenção. Mas não queriam mandar este coquetel para mim, iriam disponibilizar somente para a enfermeira e a auxiliar.  Se a enfermeira não questionasse, eu ficaria sem o remédio. O condutor é inexistente para alguns”.

Apesar de esperarmos que todos abram alas para uma ambulância passar, não é bem assim que acontece na prática. “Uma grande parte dos motoristas da cidade não respeitam”.

Ele achou que a cidade ficou bem mais vazia desde a quarentena, mas tem notado que o fluxo aumentou nos últimos plantões. “Isso porque eu trabalho de noite, imagina se fosse de dia”.

Se ele pudesse pedir algo em nome dos motoristas de ambulância, optaria por “respeito no trânsito, dando passagem sempre que possível, e a jornada de máximo 30 horas”.

Apesar dos momentos difíceis, ele diz sentir-se feliz quando sai para um atendimento em que faz a diferença. “Um engasgo de uma criança, um trabalho de parto, reverter uma parada cardíaca… você não imagina como isso me traz uma alegria, uma satisfação profissional que não dá para descrever em palavras. Então, eu me sinto útil. Eu amo minha profissão”.

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