O que ele foi e fez é maior do que a forma como ele morreu
Luciana é psicóloga há 21 anos. Sempre gostou de escutar as pessoas e achava que conseguia, de alguma forma, ajudá-las.
Quando estava se formando na área, em 1999, resolveu dar uma festa de comemoração. Contratou um rapaz chamado Marden, que tinha uma empresa de eventos. Os dois amavam música, ele tocava violão, ela também. Em três anos, engataram namoro e se casaram. Tiveram dois filhos.
Luciana via Marden como uma pessoa animada que gostava de receber amigos em casa, cozinhar, procurava agradar todo mundo. Em uma sexta-feira de novembro de 2015, depois de um dia considerado normal, foram dormir. “A gente se deu boa noite combinando o dia seguinte. Então, fui acordada com a triste notícia de que ele havia se matado”.
Começou a estudar o tema como uma forma de entender melhor o que ocorreu. Hoje, ela vê sinais de mudança de comportamento do marido naquela época, como deitar depois do almoço no escuro, coisa que não costumava fazer até então.
“A depressão não era algo visível. Hoje, vejo claramente que ele era bipolar, só que quando ele ia para hipomania, ele não se deprimia da forma mais comum de se ver. Ele continuava fazendo seu trabalho e realizando suas atividades”. Lamenta não ter tido qualquer matéria sobre suicídio na Federal de Minas Gerais, UFMG, onde se formou psicológa.
Luciana não sentiu culpa ou remoeu acontecimentos, como pode ocorrer em situações assim. Ela sentiu que Marden nunca teria feito aquilo por uma reação a algum comportamento dela. “Ninguém acaba com a própria vida por causa de alguém”. Mas o estigma era difícil de ignorar.
“Nos primeiros dias eu pensei: nossa, vou ficar de óculos escuros, porque eu não aguento nem olhar nos olhos das pessoas. Não era de vergonha, porque eu nunca tive vergonha. Tudo o que Marden foi e fez de bom é muito maior do que a forma que ele morreu. Falo com orgulho que fui esposa dele. Mas fica o estigma sim, você se torna a mulher do suicida”.
Nos últimos três anos, Luciana diz termos começado a falar mais sobre suicídio. No setembro amarelo, principalmente. E alerta para alguns mitos que a incomoda, como dizer que a pessoa que deseja se matar não ameaça, vai lá e faz.
“A gente sabe que quando a pessoa diz, tem que ser levado a sério. Isso é um sinal. Outra coisa é quando a pessoa chega a tentar o suicídio, e não morre. Ela é mal tratada nos serviços de saúde, ou até mesmo por familiares. Teve paciente minha que já escutou falarem ‘nem para morrer você presta’. Eu atendo uma pessoa aqui que o médico falou ‘isso aí é falta de homem, você tem que arrumar um namorado’”.
Luciana acha importante termos mais profissionais especializados no tema e psiquiatras trabalhando nas redes públicas, atendendo de forma efetiva. “A pessoa tem que entender sobre isso, fazer um treinamento dentro de pronto socorros, por exemplo”.
Como mensagem final, ela coloca: “Eu gostaria que as pessoas soubessem, que quando uma pessoa tira a própria vida, ela tá com estreitamento cognitivo de consciência. Ela não sabe exatamente o que está fazendo. Está tão desesperada que a única forma que ela consegue enxergar para acabar com essa dor insuportável, é se matando. O suicídio não tem a ver com falta de amor. Então não achem que uma pessoa que se matou não te amava”.
Contato da Luciana:
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