Qual seria o meio termo da vida?

 

“Se você cuida de alguém, saiba que não está sozinho. Não seja orgulhoso em pedir ajuda quando achar que deve. Ainda existem pessoas boas no mundo. Cuide de si. Só é possível cuidar de alguém se você cuida de si. Procure aproveitar o presente não se culpe pelo que passou e nem tenha medo do possível sofrimento que possa vir no futuro. Eu pensei que cuidaria da minha mãe quando ela chegasse a certa idade mas esse processo se adiantou em anos e em dificuldades. Nós nunca estaremos preparados pra cuidar dos nossos pais ou avós. Isso simplesmente acontece e quando chegar a hora só tenha paciência e dedicação”.  

Matheus Almeida – filho de Zilda Fátima de Almeida

Zilda Fátima de Almeida foi diagnosticada com câncer de útero em 2010. Na mesma semana, foi atropelada. Meses depois, teve um AVC isquêmico que a deixou acamada. Filha mais velha de quatro irmãos, nasceu no interior de Minas Gerais, em Monte Santo de Minas. Aos 17 anos, perdeu o pai e viu sua mãe abandonar a família. Cuidou dos irmãos mais novos e foi atrás de emprego. Se formou em biologia, passou no concurso dos Correios em primeiro lugar e foi parar no IBGE, até se aposentar. Ela teve um filho, Matheus, que não deixaria essa nova fase da vida deprimir a mulher que tanto admira. Ele fez de tudo para trazer alegria, ganhar um sorriso. Esse amor emociona demais.

Matheus é escrivão da polícia civil. Nas horas vagas, leva a mãe para aventuras em sua cadeira de rodas. Uma das fotos, abaixo, mostra Matheus saindo do mar com a mãe nos braços. Outra, tem os dois no meio de um campo de girassóis. Eles ainda correm maratonas de 5 quilómetros. Dona Zilda é levada pelo filho em um triciclo adaptado.

Matheus colocou na cabeça que poderia ganhar uma promoção da Latam para assistir a abertura dos jogos olímpicos no Rio 2016. Ganhou. E lá foram eles.

Durante a pandemia, ele trouxe um violonista para tocar na porta de casa. Depois, foi a vez do sax.

“A última que aprontamos foi um camarote dentro de casa pra que ela pudesse assistir ao especial do Roberto Carlos”. Matheus colou um cardápio na porta, com bebidas pagas em quantidades de beijinhos e se vestiu de garçom. Postaram um registro da montagem que chamou atenção do próprio ‘rei’. Dona Zilda ficou eufórica.

Cada foto tem um processo e os dois se divertem na montagem. Para o retrato da Frida Kahlo, por exemplo, pensaram na caracterização, no enquadramento, até publicarem nas redes sociais (@matheus.allmeida). Dona Zilda adora ouvir, do filho, os comentários que recebem.

“Ela começou a se conectar com o mundo através de mim. Até um tempo atrás eu fazia por ela. Mas hoje eu sei que faço por ela e por mim também”.

 

Ele me contactou com um depoimento, reproduzido abaixo.

“O que eu puder fazer pra ajudar outras pessoas em situações semelhantes, e pra que minha mãe tenha uma ótima qualidade de vida, eu vou fazer”.

Tenho certeza disso, Matheus.

Qual seria o meio termo da vida?

Por Matheus Almeida @matheus.allmeida

O mundo é composto por dualidades: temos a noite e o dia , o preto e o branco, o quente e o frio, a vida e a morte.  Em todos os exemplos que eu dei, há um meio termo , algo que fica no caminho, entre um processo e outro: o entardecer, o cinza, o morno..  mas qual seria o meio termo da vida?

Há quem diga que o meio termo da vida seria ali dos 30 aos 60 ou dos 40 aos 80, mas diferentemente dos exemplos que citei o “meio termo” da vida é a proximidade com a morte é aquela pessoa que nasce com uma condição de saúde frágil, está em coma ou foi acometida por alguma situação durante a vida que a deixasse ali, no meio termo.

Há 10 anos, eu assisto essa condição na minha mãe. Uma mulher independente, a frente de seu tempo passou por uma série de questões de saúde, um câncer, um atropelamento e um AVC, que a deixou com sequelas e acamada.

Por vezes, achei que acontecia algo novo. Tinha certeza que ela morreria, mas felizmente ela não morreu e eu, todos os dias, sou confrontado com a morte. Como, por exemplo, quando ela está dormindo com a respiração bem leve, quase silenciosa, eu chego e coloco minha mão sobre sua têmpora pra medir e ter certeza de que ela ainda está ali.

Saber que a morte está ali já me deixou triste, desacreditado, depressivo e não me sinto menos humano ou menos capaz por ter saboreado o amargor desses sentimentos. Até porque, o clichê mais certo de todos é também o mais verdadeiro. Ela, a morte, é a nossa única certeza. No entanto, o que já foi um medo, hoje é um apoio.

Hoje vivemos o presente, não me lamento pelo o que aconteceu nem temo o que está por vir , não espero datas especiais. Eu as adianto, comemoro dia das mães fora de época, dia das mulheres e quando não tem data ou nada pra comemorar, eu invento. Foi assim e é assim que vi a beleza da vida e o “meio termo” dela pode ser cinza, entre o branco e o preto, mas pode também ser laranja, brilhante e radiante como o por do sol que separa o dia da noite.

Aprecie o pôr do sol.

 

     

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